14/02/2025
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Coluna do Kalebe

O Janeiro Branco e Por Que Está Tudo Bem Não Estar Sempre Bem

Por Kalebe Alves

A visão começa a ficar turva, o corpo tensiona, a respiração se torna ofegante e um cansaço físico toma conta. Quem já passou por uma crise de ansiedade conhece bem essa sensação angustiante. E, sinceramente, é uma experiência que ninguém deveria enfrentar.

Infelizmente, crises de ansiedade, ataques de pânico, depressão e outros transtornos de saúde mental têm se tornado cada vez mais comuns em nossa rotina. Essa realidade levou à criação do movimento “Janeiro Branco”, uma campanha que destaca a importância do cuidado com a saúde mental. Iniciativas como essa são fundamentais, mas ainda representam os primeiros passos de uma longa jornada em busca de conscientização e acolhimento.

Falar sobre saúde mental não é fácil. Muitas vezes, mexer nessas feridas dói. Os tabus ainda nos impedem de abordar o tema com transparência, como se houvesse vergonha em admitir que não estamos bem. No entanto, é preciso encarar essa questão como prioridade. Afinal, estar mentalmente debilitado pode ser uma ameaça maior à nossa integridade física do que crimes violentos.

Um dado alarmante ilustra essa realidade. Em 2012, conforme relatado no livro “Homo Deus” do historiador Yuval Noah Harari, 56 milhões de pessoas morreram em todo o mundo. Desse total, 620 mil foram vítimas de violência, incluindo 120 mil em guerras e 500 mil por crimes. Em contrapartida, cerca de 800 mil pessoas tiraram a própria vida. Esses números mostram que somos, muitas vezes, nossa maior ameaça.

Ainda assim, a terapia é vista por muitos como um luxo, mesmo com o Sistema Único de Saúde (SUS) oferecendo o serviço gratuitamente e muitos psicólogos disponibilizando atendimentos a preços acessíveis. Além disso, a psiquiatria ainda é cercada por preconceitos. Há quem considere o acompanhamento psiquiátrico “coisa de doido” e rejeite o uso de medicamentos, mesmo quando eles são necessários para tratar condições como depressão, bipolaridade e ansiedade severa.

Esse negacionismo impede que muitas pessoas lidem com sua saúde mental de forma natural. Elas evitam conversar sobre suas dores com familiares, amigos e colegas de trabalho. Esse silêncio pode ser fatal, pois muitas vidas poderiam ser salvas se houvesse mais informação, empatia e acolhimento.

Estudos clínicos comprovam que os transtornos mentais podem ter diferentes origens. Algumas condições, como transtornos de ansiedade, esquizofrenia e depressão maior, estão relacionadas a fatores genéticos, desequilíbrios químicos e alterações estruturais no cérebro. Outras, como o transtorno de estresse pós-traumático, podem ser desencadeadas por eventos traumáticos, como perdas inesperadas, relacionamentos abusivos e experiências de abuso físico, emocional ou sexual.

Independentemente da origem, o mais importante é lembrar que os transtornos mentais podem ser tratados e, em muitos casos, superados. O primeiro passo é o diálogo. É preciso abordar o tema sem o peso do estigma social que ainda o acompanha. Está tudo bem não estar sempre bem. A vida perfeita que vemos nas redes sociais ou nos comerciais de margarina é uma ilusão.

Como dizia Guimarães Rosa, “viver é um eterno rasgar-se e remendar-se”. Assim é a ansiedade: uma onda que vem forte, mas também vai embora. Quanto mais você luta contra ela, mais ela te puxa. Se, em vez disso, você flutuar com a onda, aceitando o momento, a força dela diminui.

O segundo passo é acolher o tratamento. Contar com o auxílio de psicólogos e psiquiatras, aliado a práticas de autocuidado e uma rotina ativa, são formas eficazes de enfrentar os transtornos mentais. E sim, o uso de medicamentos, quando prescrito por um profissional capacitado, pode facilitar muito o processo de cura.

Há luz no fim do túnel e, na verdade, essa luz está dentro de você. Reconhecê-la é um ato de amor consigo mesmo e com aqueles que se importam com você.

Se você se identifica com alguma das situações descritas neste texto, procure ajuda profissional. Em casos de crise de pânico ou ansiedade, busque atendimento em um hospital. E lembre-se: o Centro de Valorização da Vida (CVV) está disponível 24 horas por meio do número 188, oferecendo apoio emocional e psicológico.

A vida vale a pena ser vivida. Aproveite o dia.

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